BRISA: O FILME

“BRISA” é o primeiro filme do projeto Cinema Possível realizado em HD e o 18º desde 2007. Contamos com a participação dos artistas: Artur Gomes, May Pasquetti e Jorge Ventura além de uma bela trilha sonora criada por Marko Andrade. Roteiro, direção e montagem de Jiddu Saldanha.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

MARKO ANDRADE - Entrevista exclusiva.

Marko Andrade é um amigo do projeto Cinema Possível, pois foi com ele que realizamos o primeiro videoclipe “COMUNHÃO”.
Hoje, 4 anos depois, resolvemos entrevistá-lo por razões óbvias. Nosso projeto cresceu e Marko continua firme com sua linguagem musical sofisticada e articulada nas raízes do melhor da música carioca.
Convidado para fazer a trilha sonora do filme “BRISA”, ele expõe, nesta entrevista, um pouco de sua visão de mundo.


Marco Andrade em Lumiar.
Cinema Possível - Marko sempre quis te perguntar isso: você é um músico apenas, ou um músico negro, qual a implicação desta reflexão?
Marko Andrade - Acho que esta reflexão eu faço também a minha vida inteira. A música faz parte do meu DNA, sempre fez, mas quando me descobri negro numa sociedade perversamente  preconceituosa, foi que eu me deparai que antes de tudo sou uma afro descendente, um sobrevivente e que a música seria minha ferramenta de  luta, de expressão e de reflexão nesta sociedade.

CP -  No teu CD Aldeia Afro Tupy há um flerte direto com o jongo e outros
ritmos afro-brasileiros, isso foi uma pesquisa? Uma vivência? Transpiração?
Transgressão?
MA - Na verdade e tudo isso junto, vivenciei o CD intensamente pois passamos, eu, Rodrigo Braga, Luiz Carlos batera, Antonio de Souza  e Jô Santana fazendo um laboratório intenso para conseguirmos uma sonoridade que pudesse traduzir nossas identidades, mas que fosse algo particular antenado com modernidade e com a poesia. Eu quis também colocar entranhado no CD um pouco do que aprendi com Darcy Ribeiro e o Darcy da serrinha. Trabalhei com ambos e foram muito importantes para o aprofundamento da minha leitura e interpretação deste Brasil de hoje, de como ele se configura e formatou este novo tipo de gente, em especial que futuro nos guarda... E o processo de maturação do CD foi também um grande privilégio pra mim, pois, reencontrei Luiz Carlos Batera , fizemos algumas parcerias e tive o prazer de conviver com um dos músicos mais espetaculares do mundo.  O resultado disso é que o CD tem uma mistura de Don salvador e Grupo Abolição, Banda Black Rio, Samba, Vanguarda do Jongo que fez parte da minha formação musical e se espalha mais lá na frente.

A louca

Eram antigos os buracos-corpos
Entalhado lentamente em memória-esculturas, 
E ela mesmo assim cuspia seus ossos-ruas
Na escuridão dos dias.
Os berros entalados no peito
E a solidão medieval,
Adormeciam as tardes na insônia dos bondes.
Um nectar lento e corrosivo
Transbordava-lhe a alma inteira
E ela mesmo assim girava a cabeça,
Escavava com as mãos cruas um deserto-fardo,
E em seu intenso peito farpado,
Emoldurava uma bela e estranha flor.

(Marko Andrade)

CP - As pessoas falam muito que letra de música e poesia são coisas diferentes e você é poeta também. Existe essa diferença dentro da
tua cabeça?
MA - Eu não consigo trabalhar com esta diferença. Pra mim a poesia é uma atitude diante do mundo e você pode traduzir esta atitude em forma de letra de musica, em forma de musica, em movimentos do corpo, em forma literária, etc., ou seja, esta linha de compreensão me faz implodir estas muralhas acadêmicas, que quadriculam e recortam tudo, estabelecendo limites meramente formais para uma questão que vai muito além da formalidade, pois quando falamos de arte falamos de uma linha muito tênue entre a lucidez que pode ser uma forma de prisão, e a loucura que pode ser uma força libertária.

CP -  A criança, o menino, o jovem e Marko Andrade, o que lia, leu, que
Influências chegaram e partiram?
MA - Eu li de tudo, da filosofia ao romance;  histórias e ensaios; dramaturgia e contos, etc. Isso desde muito cedo. Alguns  autores me marcaram.  Posso citar Spinosa, Foucault, Lima Barreto, João do Rio... Amo quadrinhos; ou seja, li e leio um pouco de tudo.


Minha prima macrô
Era a casa, um lugar branco,
Um recanto um sabiá,
Dias mastigados a vagar,
Cereais, corpos alvos,
Corações esverdecidos,
Aldeias salinas e fermento.
Transversais em sais,
Luzes, cristais do oriente,
Alho, malte, chá, gergelim,
 E um aroma doce no ar.
Mas a pele em febre sem refino
Vaza em fundo de desejos e ereção
Dissolvendo halo vegetal
E delatando sem verbo
A carne

(Marko Andrade)


CP – A pergunta que não quer calar: e o racismo?
MA - Eu entendo que o racismo no Brasil continua. Como sempre é escondido. Coopta os negros, embranquece os mestiços, e pinta os braços de preto. Tem uma perversidade entranhada, produto de uma engenharia ancorada no cinismo.

 CP – E a sua experiência com trilhas para teatro, cinema, como é isso?
MA -  Minha experiência com trilhas não são muitas, mas já trabalhei em algumas peças de teatro e um curta que foram muito importantes para mim, pois gosto muito desta mistura que possibilita a geração de tecidos instigantes, som e imagem; interagindo e reinventado novos ambientes. Gosto muito desta possibilidade.

CP – Quem é Marko Andrade por Marko Andrade?
MA - Meio louco, meio torto, meio transversalizado, meio radical, meio flutuante, meio pedra, meio gás, meio liquido, meio carne, meio osso... ,Mas todo coração!

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Marko Andrade